Úrsula não é um romance qualquer. Ao me deparar com a oportunidade, senti gratidão ao ler, reler e me atrever a preparar esse texto que transmite ao leitor múltiplos sentimentos. Me vi diante de uma narrativa histórica do século XIX que nos é apresentada por uma mulher, brasileira, afrodescendente, escritora, abolicionista. Tantos atributos de autora e obra. Um orgulho, uma justiça. É por justiça que torcemos ao mergulharmos em Úrsula.
Essa narrativa pioneira de denúncia é rica em diálogos e monólogos que não somente nos prendem pelo conflito amoroso entre a protagonista Úrsula e seu amado Tancredo, como já é de se esperar pela tradição romântica, mas principalmente pelo foco na construção das personagens secundárias do livro, trazendo o drama do contexto histórico. Úrsula é o romance que dá voz aos escravos e aos seus pontos de vista e sentimentos. É com empatia e tristeza que ouvimos as vozes de Túlio, Susana e Antero em meio ao sofrimento proveniente da escravidão.
Preparar Úrsula é desafiador na medida em que se há o desejo de preservar a escrita de Maria Firmina dos Reis mas, ao mesmo tempo, o de adaptar seu texto para mais perto do leitor dos dias atuais. O trabalho com o livro é esse lugar que busca equilíbrio entre todos os elementos. É prazeroso analisar cada linha, estudar o parágrafo, enfatizar cada referência, descobrir as verdades escondidas na narrativa, aprender sobre a realidade daquele século, perder-se nos amores, nos conflitos, arrependimentos, tristezas, torcer pelas personagens e sofrer com suas quedas. Em contextos ora belos, ora melancólicos, a obra que assim também pode ser definida merece a admiração e respeito dos profissionais que a ela se dedicam.
Por fim, só posso dizer que me resta agradecer por essa obra herdada de Maria Firmina, esse romance notável e de extrema importância, e pedir ao leitor que, ao apreciá-lo, reflita criticamente sobre a história e identidade brasileiras.